TEMAS

terça-feira, maio 31, 2011

GILL SCOTT-HERON (1949-2011): O PAI DO RAP.





Obras Primas:


• Free Will (1972; Flying Dutchman Records)
• Spirits (1994; TVT Records)

segunda-feira, maio 30, 2011

"STREET TAPES" E "THUGS" - NA ARENA COM DUDU RODRIGUES

Entrevistamos* o jovem “expedicionário” do vídeo e da cultura urbana Dudu Rodrigues, por ser um caso sério na mudança de atitudes no seio dos activistas e artistas, por representar a verdadeira nata da mais jovem cultura e arte nacional e, sobretudo, por ser uma pessoa esclarecida na sociedade cabo-verdiana actual. Enquanto artista é contemporâneo, universalista e adepto de uma certa estética hip hop.





Na segunda metade do mês de Outubro de 2009, o Centro Cultural Francês na Praia foi-lhe dado oportunidade para exibir uma obra em vídeo, num certame com um programa dedicado ao Cinema de Animação. Dudu Rodrigues que trabalha com técnicas de plasticina e animação multimédia, para alem de organizar eventos, é na verdade o prodígio protegido desta instituição. O CCF, mais criterioso e elitista na escolha que faz dos seus artistas, mais virado para as artes plásticas, musica e literatura, tem dado, sempre, cautelosamente, uma “mãozinha” ao audiovisual nacional mas, ao que parece, deixa aos verdadeiros interessados a incumbência de a construir. É nesta charneira que se visualiza toda a arte de Dudu Rodrigues que não se limita apenas aos vídeos de animação mas que se assume como activista e modelo de consciência da juventude.



Fala-nos um pouco desta actividade que tem estado a desenvolver. O que é que está na base do “Hip Hop Solidário” o movimento recentemente criado por si e pelos seus pares? Qual é a filosofia desta acção?
O hip hop consciente da DJuntiarti é um projecto que tenta fazer actividades e show hip hop, desde a área da música, dança, pintura, e modalidades do hip hop – graffitti, MC, DJ – mas trazendo isso num formato diferente. Apresentação de um vídeo reportagem de um artista que vem participar no show. O show é mensal e cada vez temos novos artistas e cada mês novas entrevistas a ver o que fazem. As novas modalidades que trazem: enfim, como é o ensaio e como é que é o processo de produção. O conteúdo do vídeo tem dois sectores interessantes: num sector mostramos a realidade dos jovens caboverdeanos (o bairro, o dia-a-dia, a família, o grupo social e as conversas); num segundo sector interessante é como é que este jovem tendo uma condição diferente faz arte. As dificuldades que têm em fazer o seu trabalho, como vem a explicação e como vem a ideia. Isso é apresentado antes do show. Temos 15 minutos antes do show. São todos estudantes e todos trabalham na edição e escrita de textos. Temos cerca de 50 GB de conteúdos e seis meses de trabalho. São cerca de 30 grupos de rap no DJUNTIARTI e to¬dos um vídeo de mais ou menos 5 minutos sobre a vida deles.



Enquanto artista tem estado a desenvolver algum projecto?
Este projecto DJUNTIARTI parece mais de inclusão social do que artístico. O projecto inicial eu tinha sempre a ideia de fazer um vídeo que falasse dos problemas dos jovens. Como não sou rap o projecto inicial era estudar o comportamento dos rappers e fazer um vídeo sobre isso. Mas nessas coisas o resultado é imprevisível você vai sempre encontrando coisas novas e os resultados vão se alterando. Mas o projecto continua a ser fazer um vídeo.



Com que regularidade põe os seus vídeos no youtube?
Não, ainda não. Eu tenho a seguinte estratégia: o que eu quero criar é uma rede – uma rede tanto entre os artistas mas que tem algum conteúdo que se possa segura-se por mais tempo.
Os vídeos são feitos numa câmara DV normal estamos a fazer vídeo de celular para celular. Somos ainda uma equipa recem-formada. Ainda estamos na parte de definir o objectivo do grupo. Daqui a lgum tempo pode vir a se transformar em algo. Temos patrocinadores em mente. Por agora temos o único apoio o CCF.


O Dudu Rodrigues já deu um passo em frente a nível do vídeo. Realizou um filme de animação dos bons. Pensa continuar nesta senda?
… digamos que neste momento sou apenas um artista e vou continuar a fazer o trabalho. Neste preciso momento estou a trabalhar os meus bonecos para o meu próximo filme de animação que vou exibir no Palácio da Cultura. Faço isso em paralelo com o trabalho de activismo social. A parte do conteúdo é a razão porque estás a fazer aquilo. Eu já tenho o meu conteúdo que é justamente o trabalho que faço enquanto homem, activista social e artista. Podemos ter um trabalho técnico muito bom e a nível de conteúdo não ser tão bom assim. As vezes temos artistas que levam décadas a descobrir o seu estilo próprio e a razão da sua arte. Posso dizer que estou a ser pago para aprender.



Fala-me um pouco mais do projecto DJUNTARTI
O projecto DJUNTIARTI não é só um show de hip hop. Imagina de cada vez que fazes um show como produtor tens que contactar o artista antes do show e ás vezes no mesmo dia de show. O nosso é diferente. Contactamos antes e durante o projecto até ao dia em que ele actua. O que é que nos leva a fazer isso? Há projectos que jamais apareceriam no mercado se não fosse assim. Como já existe um projecto (que é o DJUNTARTI) não temos que estar a bater em cada porta e perguntar se há algum projecto. Em termos técnicos é muito aliciante. E quando vais filmá-los ao mesmo tempo que criar estás produzir um arquivo desse artista. Daqui há alguns anos esses jovens podem ser advogados, actores e quererem as imagens. Ou pelo simples facto de que esses vídeos propiciam aos nosso pais saberem um pouco das nossas vidas, não é? O que de uma outra forma não haveria possibilidade de me ver. Alem disso daqui há alguns anos esses vídeos poderão ser autênticas relíquias. O trabalho de animação está incluída num miniprojecto Double Click – duas pessoas eu capto o video e Nats edita.



E Ficção?
São múltiplas estórias que eu vivi desde a minha infância. Eu já tive pessoas amigas que se suicidaram que mataram. Percebi a determinada altura que não era só uma estoria minha, mas uma estoria de outras pessoas. Daí procurei apresentar-me não como aquele que é autor disso mas sim como aquele que presencia tal coisa. Qualquer alguém que venha a fazer algo sobre hip hop encontrará coisas que já aconteceram há décadas porque houve coisas que forma uma explosão daquilo que aconteceu há anos atrás. Só agora a imprensa o divulgou. Mas isso de thugs já tem décadas de existência.



De algum modo o fenómeno é provocado pelo acesso que os jovens têm às imagens de violência?
Essas imagens podem dar a ideia de fazer. Mas eu acho que é melhor ver sob o ponto de vista de afirmação. Porquê? Pen-semos num jovem que não está contemplado pelo projecto social que não passa de número de estatística. Ou seja não fazem parte de nada. Não têm direito a nada, nem mesmo direito a uma bolsa de estudos têm. O que é que se pede a alguém que não tem nada? Por exemplo alguns grupos de rapazes no liceu se destacam assim. Costumávamos ouvir de alguem “Kel rapazinhu lá é malkruiadu, ahn?!”. Quando ouvimos algo assim ouvíamos como se fosse um elogio, o que é um erro. Se um pai tem um filho macho que bate noutro pode chatear e repreender mas no fundo fica com orgulho: “o filho é valente”. Por isso não podemos condenar algo por aquilo que no passado ajudamos a criar. Isso é algo na história da adolescência. O que devemos apoiar é o que se faz mais pela positividade. Destacá-los como ídolos, como modelos. Um jovem que não se considera nada pensa assim: se calhar se me juntar aos thugs ganho algum respeito. É mesmo uma questão de afirmação.



*[Entrevista efectuada no átrio deo Centro Cultural Francês, em Novembro de 2009]



Esta reflexão de Dudu Rodrigues traz-nos, naturalmente, uma outra reflexão - a do conflito de gerações, no qual ele parece constituir, obviamente, uma figura consensual. Em relação a isso novo “expedicionário” do vídeo terá, assim, forçosamente, que evitar relacionamentos lineares; desfazer o medo de “umbrais” de sentido; tomar como natural as contingências da nossa produção nacional, que devem ser vistas como simples etapas a ultrapassar; buscar uma maior capacitação tecnológica; evitar estribilhos como aquele de que o povo cabo-verdiano só tem apetência para a música; e trilhar os caminhos da ficção cinematográfica, aventurando-se por essa nova possibilidade expressiva para, assim, entrar num novo ciclo. Para isso alguns pré-requisitos deverão ser levados em linha de conta: se houver, como propõe José Herrera (2000), a criação de irmandades em diversos domínios da criação; se emergir a consciência de que o trabalho de equipa é muito mais importante que a obsessão individual e o laxismo; que o correcto ajuizamento é de que uma criação nunca é completamente original e individualizada. Cumpridas estas condições as coisas poderão melhorar significativamente no meio artístico que se avizinha. Home videos e pequenas produções terão, certamente, o seu devido valor enquanto arte e afirmação no seio de uma camada juvenil que já não quer tanto ler ou escrever mas, sim, filmar.




O cinema autóctone (de modo ainda incipiente em grupos vindos do meio artístico teatral) sairia por certo de um sector privado, mas teria algo de eminentemente social porque esse grupo a existir terá que ter uma verdadeira consciência do meio para poder avançar com segurança. Honestamente creio que vai haver tudo isso antes que o governo tome uma decisão em relação ao sector. Porque do lado de cá da arena cultural a imaginação e a capacidade de produção não falta aos seus intérpretes.







quarta-feira, maio 25, 2011

terça-feira, maio 24, 2011

CENTRO CULTURAL PORTUGUÊS / INSTITUTO CAMÕES

Esta entrevista, no ano de 2010, com o Dr. João Neves, Director do Centro Cultural Português – Instituto Camões, instituição baluarte da lusofonia, foi movida por um secreto desejo direccionado para a afirmação da moderna cinematografia portuguesa na realidade cabo-verdiana, e para que a nossa futura cinematografia viesse a ser incentivada na arena das relações humanas e intercâmbio de ideias entre os criadores de ambos os lados. Algo que pareceu encontrar, naturalmente, eco nos desígnios do actual director do CCP-IC em Cabo Verde.




Qual o espaço ocupado pelo Audiovisual na vossa programação?
A nossa programação está estruturada em dois grandes blocos: uma que é a área da exibição e a outra da produção. Organizamos a nossa exibição em duas grandes mostras: uma para a área de documentário com um festival chamado Lisbon Doc TV que hoje em dia tem uma parceria com a DOC Lisboa e com a Associação Portuguesa para o documentário – a APORDOC - e contamos exibir ainda uma edição deste festival em Cabo Verde. E temos ainda outras secções relativas á produção ainda para este ano 2010 e que visa mais a exibição de curtas. Tratando-se da produção nós não temos ainda capacidade para apoiar uma produção mas sim de proporcionar contactos e possibilidades de negociação. Este ano pensamos retomar algumas das exibições de filmes portugueses desde que tenhamos autorização de exibir.




Equacionar nesta altura a viagem de um realizador, com o retorno que daí resulta, nesta fase, é bastante difícil. É que ainda não temos um público para custear uma viagem. Se calhar pro¬mover um encontro com os realizadores para que estudem e vejam uma forma de fazer as coisas. Prefiro muito mais esta faceta. A forma de divulgação da língua portuguesa não pode só ser feita por si. É um encontro de civilizações, um encontro de pessoas.


A cultura é produzida por pessoas. O que é importante aqui é que para além de pôr as pes¬soas em contacto com a língua é melhor pôr as pessoas em contacto entre si. Desse encontro deve gerar-se uma nova realidade, uma nova possibilidade de criação. E, portanto, este é o princípio básico do nosso crescimento. Não é trazer para mostrar o que nós fazemos mas é, sim senhor, proporcionar um contacto com a contemporaneidade artística de forma a que quem cá venha também leve essa forma de contemporaneidade artística. E é desse encon¬tro que se aproximem ideias, que se aproximam pessoas. Nós não fazemos exibição, nós promovemos cultura.



Não será, ainda, um pouco paternalista o modo como as coisas são idealizadas?
Não me preocupam a questão das dominações. Eu não tenho uma perspectiva nem paternalista nem uma perspectiva de exibição de uma superioridade intelectual. Nós colocamos a disposição dos criadores propostas artísticas. (…) e agora cumpre aos cabo-verdianos que também não conhecem muita coisa contactar, conhecer, gostar, apreciar e ficar a acompanhar esse fenómeno artístico e ao português “olha isso existe em Cabo Verde e é interessante ser visto em Portugal e da mesma forma aquilo que é Português que os cabo-verdianos possam ver do outro lado do Atlântico”. Eu tenho muitas estórias desta plataforma que nós temos que criar aqui plataforma porque isto é local de encontro de diversas pessoas, personalidades, etc.



Qual o papel do governo nisso tudo?
Tem sido positivo do ponto de vista daquilo que eu vejo, da energia das pessoas, da criação das ideias. Nós somos uma entidade estrangeira não estamos aqui para avaliar as actividades do governo. O que eu vou dizer aqui não é uma avaliação do trabalho do governo de Cabo Verde nesta área. O que eu gostaria era maior interesse das instâncias diversas oficiais pelo menos naquilo que já existe no audiovisual e multimédia e que eles podem dar um contributo de modo a projectar noutra dimensão. Mas não digo. Lembro-me desta parte. Nós tivemos o primeiro festival da CPLP – o primeiro – aqui em Cabo Verde. Nunca mais se fez e não me compete a mim as razões porque isso não aconteceu. Eu gostaria muito que Cabo Verde pudesse organizar mais festivais desses.





[Entrevista realizada em Abril de 2010]

quarta-feira, maio 18, 2011

LEÃO LOPES - O PAI DA MODERNA CULTURA AUDIOVISUAL CABOVERDEANA

Leão Lopes - "São Tomé - Os Útimos Contratados" - Preparação de entrevista a Alda Espírito Santo - Setembro 2009


Destacamos aqui a figura incontornável de Leão Lopes que já foi, uma vez, Ministro da Cultura, por considerá-lo, sem margens para a dúvida, o “Pai” da moderna cultura cabo-verdiana audiovisual e cinematográfica. Essa entrevista vem na sequencia da produção do filme “S. Tomé - Os Ultimos Contratados”.


Em que condições técnicas de produção, rodagem e pós-produção o documentário “S. Tomé - Os Ultimos Contratados” foi realizado?

As condições de produção foram mínimas, mas eficazes. Consistiram numa viagem prévia de preparação no terreno e estabelecimento do roteiro e na montagem financeira do projecto. A rodagem realizou-se em boas condições com suficientes meios locais de produção e uma pequena equipa com elementos ha-bituados a trabalhar juntos. Os meios de equipamentos foram reduzidos, mas suficientes e adaptados às circunstâncias; interior de S. Tomé, com alguns acessos difíceis e clima instável na ocasião. Quanto à pós-produção, tenho referido que foi facilitada e muito, pelo facto de a ter realizada no país, com meios próprios e de M_EIA, a escola superior de Arte a que estou ligado.


Como surgiu a parceria com a Plataforma das ONG’s em Cabo Verde?
A Plataforma apenas se ocupou da realização da estreia na Praia e em S. Vicente, contribuindo para trazer alguns dos participantes no filme que estiveram presentes na estreia na cidade do Mindelo. Uma importante contribuição da Plataforma e do Cônsul de Cabo Verde em São Tomé, determinante para que o filme tivesse o impacto e bom acolhimento que teve em Cabo Verde.

Recebeu algum apoio do Instituto das Comunidades (MNECC) neste projecto?
Não. Que diria da terminologia “documentário de criação” utilizada para definir esse seu ultimo trabalho e o anterior - “Bitú”? Creio que todo o documentário é de criação, apesar do seu carácter documental e expositivo e desde que não se confunda com grande reportagem. Todavia, acho interessante a terminologia “documentário de criação” que, talvez queira propor uma abordagem do documentário mais livre e que pode oferecer ao realizador imensas possibilidades tanto ao nível da narrativa como dos recursos de linguagem fílmica. Um filão a explorar.

Quais são as suas influências /referências no cinema e documentário internacionais?
Seria uma banalidade dizer que todo o bom cinema seja ficção ou documentário são referências podendo ser muito bem influências no sentido de procura de uma linguagem. Não tenho influências objectivas por esta razão, são as boas obras e os bons autores a minha escola, a minha aprendizagem. Desde a proposta estética do Eisenstein, passando pela inteligência da narrativa de Chaplin à desconstrução de Felini, ou à poesia de certos filmes de Almodovar, à irreverência do Woody Allen, ao lirismo de Kurosawa, todos representam o meu universo de culto e aprendizagem. Quanto a documentários tenho uma experiência muito relativa, conheço muito pouco da história do documentário e consequentemente os seus autores mais relevantes. Na verdade, o documentário para mim é terreno ainda de muita aprendizagem. Recentemente descobri o documentário cubano e brasileiro aquando de uma vista a Cuba e ao Brasil. Fiquei muito impressionado pela qualidade das obras que me foram dadas a conhecer. Alías, tanto as políticas públicas para o cinema como a produção cinematográfica destes dois países são incontornáveis referências para nós.


O que é que pensa do trabalho de Michael Moore?
Nunca vi nenhum trabalho de Michel Moore, mas tenho lido muita coisa sobre o seu trabalho e sobre seu espírito crítico, acutilante, em relação à política e monopólios americanos. Fascina-me no Moore o activista, a sua coragem e frontalidade. Já vi uma entrevista dele na televisão onde fiquei a conhecer um pouco das suas motivações enquanto realizador. O Atelier Mar tem vindo a desenvolver uma série de acções de grande importância para a cultura nacional, que extravasa as produções audiovisuais e artísticas para se situar, por exemplo, na questão dos problemas ambientais, culturais, etc. Na sua óptica qual é o lugar do Atelier Mar relativamente às outras instituições \ organizações cabo-verdianas que se têm dedicado a transformar a face da nossa cultura. O Atelier Mar, assim como outras ONG’s nacionais têm des-empenhado um papel interessante na sociedade caboverdeana. O Atelier Mar, na verdade, actua especialmente no domínio da cultura enquanto motor de desenvolvimento de pessoas, de colectivos ou comunidades, em várias frentes: educativas, culturais, investigação, arte, economia e tecnologias alter-nativas várias. O lugar do Atelier Mar será aquele que a sociedade caboverd¬iana o reconhecer enquanto ONG empenhada no desenvolvimento do nosso país.

Pensa abraçar definitivamente o documentário como modo de expressão estético-moral ou pondera ainda aventurar-se pela ficção?
Faço cinema “adjectivamente”, como diria Baltasar Lopes, pelo que não produzo este tipo de determinismo. Contudo, continua a interessar-me o documentário como um modo de expressão, uma oportunidade de indagar para conhecer, uma forma de actuar com imensas possibilidades de se insta¬lar nestas ilhas, enquanto produto cultural de excelência.


“Ilheu de Contenda” foi o seu primeiro trabalho enquanto realizador e o único em género ficção. Como foi trabalhar com Paulo Sousa, nessa altura?
Foi grato trabalhar com Paulo de Sousa. Ele confiou em mim e investiu muito no filme, a todos os níveis, incluindo na determinação de que”Ilhéu de Contenda” se faria apesar das pedras vindas especialmente de alguns “bons” caboverdeanos que tudo fizeram para que o filme não se realizasse. Toda a gente deve estar lembrada daquela “conheço Felini, conheço Kurosawa, mas quem é Leão Lopes”? O mal dissente que parecia conhecer estes grandes nomes do cinema, afinal não conhecia nada. A única verdade contida nessa diatribe era que de facto não conhecia Leão Lopes. Porque se o conhecesse tinha tudo para o aproximar da história destes criadores, que tal como Leão Lopes, fizeram um dia o seu primeiro filme; tal como Leão Lopes, foram artistas plásticos antes do cinema e continuaram sendo; que os três entraram no cinema pelos mesmos caminhos. Mas Leão Lopes tinha tudo a perder; não nasceu na Itália, nem na China. Pagou caro por ter ousado fazer um filme na sua terra. Pena é que nunca tenha sido possível fazer-se a estreia do filme na Praia, nem nunca a nossa televisão passou a série que produzi para esse formato e realizado em simultâneo ao filme, de 3 episódios de 50 minutos cada. Os cabo-verdianos nem sabem que “Ilhéu de Contenda” foi premiado algumas vezes lá fora, incluindo no Fespaco (melhor música), que teve sua banda sonora editada, entre outras apreciações que mereceu durante a seu percurso. Também nem deram conta que na primeira edição do festival de cinema de Francisco Manso realizado em Cabo Verde, o filme não foi seleccionado.

Temos hipótese para ter, num futuro próximo, uma cinematografia nossa, de relevância? Sendo o nosso país de vocação dominantemente literária?
Não creio, pelo menos tão cedo. Não temos visão política neste domínio, tanto no plano educativo como no de produção. Teríamos alguma possibilidade dada pela história deste país e pela sua diversidade cultural.


Voltando ao seu último trabalho “S. Tomé - Os Ultimos Contratados”: sendo o filme vanguardista revela também o seu mundo interior quando conduz o problema ao campo da expressão artística (música e poesia) em vez de seguir o social «ritualizado» no quotidiano são-tomense com todos os seus problemas actuais. Concorda com esta afirmação?
Concordo. Tenho referido que “S. Tomé” é bastante intimista, não é um relato, é um mergulho muito dentro de nós caboverdeanos. Não fui para o terreno com esta intenção, deliberada. Fui com uma certa bagagem de conhecimento do problema e um itinerário esboçado impelido pela urgência de voltar a estar com aquele gente, desterrada, sem culpa. O filme foi escrito com a câmara em cima daquele drama de que eu próprio faço parte. “S. Tomé” sou eu também.




[Entrevista realizada a 08 Junho de 2010]

terça-feira, maio 17, 2011

A PRÁCTICA VIDEOGRÁFICA

As peculiaridades da prática videográfica sempre se fizeram sentir, tendo-se registado, desde logo, as primeiras manifestações de uma certa transgressão diegética . Em 1984, Michael Klier realiza Der Riese, um marco na recente e pequena história do vídeo: uma “reciclagem” das imagens captadas pelas câmaras de vigilância de aeroportos autopistas e aparcamentos. Eram imagens roubadas e unicamente acompanhados de uma música extra-diegética envolvente que surpreenderam pela novidade e singularidade. (MANUEL PALACIO: 2005).


O vídeo vanguardista e os filmes-ensaios viriam a aparecer num conjunto mais vasto de propostas estéticas, enten-didas como processos de transgressão relativamente ao bom gosto e à aura artística estabelecida. Como refere Josep M. Català no seu artigo “Film Ensayo y Vanguardia”, cineastas independentes, que filmavam em 16 mm, tinham a consciência dessa aura artística que imperava na época mas, com muito à vontade, elaboraram projectos que não iam ao gosto do público e, consequentemente, das cadeias televisivas da época, tendo alguns deles migrado para a prática vídeográfica, tout court. (CATALÁ: 2005). Esta segunda tendência é a que caracteriza a geração que emerge da prática videográfica nos anos 60-70 nos EUA.




O nascimento do vídeo coincide com este período. Só que, em relação ao vídeo, a técnica estava lá antes dos problemas artísticos que acabaram por ser solucionados por meio desta técnica. Como observa Renato Barilli, na sua obra “Curso de Estética” (1989) “o vídeo desenvolveu-se, completamente, antes que alguém soubesse o que fazer com ela”. Em 1969 a primeira exposição integralmente consagrada aos trabalhos realizados em vídeo foi a célebre “TV as a Creative Medium” (Nova York, Howard Art Gallery, 1969). Com esse título também se denomina a primeira publicação ao tema: o capítulo que Gene Youngblood dedica a este tema em “Expanded Cinema”, em 1970.





Foto: Der Riese - Michael Kier

quinta-feira, maio 12, 2011

A ERA PIONEIRA DOS PORTAPACKS

A 31 de Dezembro de 1963, na retransmissão de uma partida de futebol americano utilizava-se, pela primeira vez, o instant replay (a repetição da jogada) numa emissão televisiva. Em meados dos anos sessenta (1965-1968) a empresa japonesa Sony comercializa, nos EUA, o primeiro vídeo dirigido a um mercado de consumidores fora do circuito televisivo. Eram vídeos portáteis que gravavam em branco e negro, baptizados de portapack, nessa era pioneira. O magnetoscópio portátil que, antes, devia ser transportado num carrito, se pode agora transportar ao ombro numa pequena caixa. Ninguém, então, previa que o novo suporte de imagens pudesse vir a ter algum tipo de conteúdo próprio ou ser motivo para novas formas de expressão dotadas de uma certa autonomia estética, como a que Nam June Paik (n.1932, Seoul), um dos pioneiros na arte da vídeo instalação, viria a protagonizar ao realizar, em 1966, a primeira instalação com monitores de TV.







As mudanças drásticas e perturbadoras do vídeo surgiriam, porém, quando a Sony introduziu, em 1969, o sistema de registo helicoidal que permitiu gravar em fitas de menor diâmetro. Aparece, assim, no mercado, o Videocorder AV-3400 Sony e todos os equipamentos foram reduzindo, drasticamente, as suas dimensões, tornando-se no principal mote de desenvolvimento de uma vanguarda artística, nos anos seguintes. De salientar que o aparato video popularizado pela SONY (sim¬paticamente baptizado de portapack), se apresentou no espaço público como a primeira grande alternativa para conseguir o completo controlo sobre o processo informativo, até então dominado pelas emissoras televisivas. Suas características de manejo, de ligeireza e leitura imediata, o convertiam na ferramenta ideal de intervenção social.

quarta-feira, maio 11, 2011

FESTIVAL “BLACK & WHITE” ARRANCA HOJE NA UNIVERSIDADE CATÓLICA DO PORTO

Arranca, também hoje, o Festival “Black & White” no Porto, que se prolongará até ao próximo sábado, 14 de Maio. Trata-se, já, da VIII edição de uma competição audiovisual que ocorre todos os anos na cidade invicta. Durante quatro dias, a Escola das Artes da Universidade Católica no Porto torna-se palco do certame que, este ano, conta com um total de 46 obras – 30 vídeos, oito sequências fotográficas e oito áudios, provenientes de 13 países.


Esta iniciativa procura educar os espectadores para a especificidade do preto e branco.


FESTIVAL DE CANNES 2011 COMEÇA HOJE!



FILMES EM COMPETIÇÃO 2011:

La Piel Que Habito, Pedro Almodóvar.
L’Apollonide – souvenirs de la maison close, Bertrand Bonello.
Pater, Alain Cavalier.
Hearat Shulayim, Joseph Cedar.
Bir Zamanlar Anadolu’da, Nuri Bilge Ceylan.
Le gamin au vélo, Jean-Pierre e Luc Dardenne.
Le Havre, Aki Kaurismäki.
Hanezu no tsuki, Naomi Kawase.
Sleeping Beauty, Julia Leigh.
Polisse, Maïwenn.
The Tree of Life, Terrence Malick.
La source des femmes, Radu Mihaileanu.
Ichimei, Takashi Miike.
Habemus Papam, Nanni Moretti.
We Need To Talk About Kevin, Lynne Ramsay.
Michael, Markus Schleinzer.
This Must Be The Place, Paolo Sorrentino.
Melancholia, Lars von Trier.
Drive, Nicolas Winding Refn.




Secção "Un certain regard"

"Um Novo Despertar" de Jodie Foster,
"The Artist" de Michel Hazanavicius,
"The Conquest" de Xavier Durringer
"Os Piratas das Caraíbas: Navegando em Águas Misteriosas" de Rob Marshall. (Estreia Mundial)

Exibições Especiais

"Labrador" de Frederikke Aspock,
"Le maitre des forges de l’enfer" de Rithy Panh, Michel Petrucciani de Michael Radford.
"Tous au Larzac" de Christian Rouaud.
"Les Bien-aimés" de Christophe Honoré. (Encerramento do Festival).

segunda-feira, maio 09, 2011

O NASCIMENTO DO VÍDEO










Nascia oficialmente, na noite de 30 de Novembro de 1956, na Convenção Anual de Radiodifusão na cidade de Chicago, aquilo que viria a ser a oitava musa de todas as artes: o vídeo. A indústria televisiva estado-unidense estava a braços com os problemas de transmissão que resultavam das diferenças horárias existentes entre as duas costas do seu território, isto é, aquilo que o cinema (e suas actualidades ocasionais) não conseguia fazer. Necessitava, afinal, de um suporte audiovisual que resolvesse de uma maneira mais cómoda tais dificuldades. Criou-se, assim, um novo aparato tecnológico revolucionário - uma patente da Ampex - que registava imagem e som de uma emissão televisiva numa cinta magnética de 5 cm de diâmetro.




Era um equipamento de grandes dimensões e se compunha de um sistema propulsor que transportava a fita de uma bobina para outra, num tambor de quatro cabeças que efectuava o registo ou a reprodução da imagem e sons a 250 r.p.s. (rotações por minutos), apoiando-se numa fita disposta num sector vazio da máquina. Produzia 25 imagens por segundo, o que equivalia gravar programas de cerca de uma hora, com 1500 metros de fita. O vídeo permitia, a partir daí, que uma determinada notícia pudesse ser emitida nos informativos da costa Leste e três horas depois, sem muita dificuldade, (depois de registadas), nos informativos da Costa Oeste. O magnetoscópio, ora inventado, ficaria ao serviço das necessidades de armazenagem e arquivo de programas.




Durante mais de uma década o suporte electromagnético de registo de imagens e sons pertenceria, em exclusivo, às cadeias televisivas.



Bibliografia: TORREIRO C. et alii. (2005). Documental y Vanguardia. Madrid: Catedra.

sexta-feira, maio 06, 2011

CULTURA AUDIOVISUAL (Definição)












Começa aqui uma nova rubrica no «Tempo de Lobos». Depois de uma série de incursões por domínios da escrita criativa (alfabeto, referências cinematográficas, enquadramentos, números) vai-se passar a trazer, post por post, informações, opiniões, histórias e interpretações sobre o que já é uma presença constante nos debates da esfera pública e académica, a nivel internacional: a cultura audiovisual. Em Cabo Verde este tema é completamente ignorado e mal-entendido. A maioria dos intelectuais e opinion makers procura posições de sentido cômodas, como por exemplo, a de circunscrever essa realidade apenas ao universo das emissoras televisivas nacionais. Mas esta história já vem desde os anos 60-70, desde os EUA passando pela Europa:




A cultura audiovisual é, na sua origem, uma emancipação cultural face às emissoras televisivas, que representam o poder centralizador do media televisivo. Configurou-se, definitivamente, como um manancial de experiencias contemporâneas à volta do vídeo, “contracultura” e atitude libertária. Dela fazem parte artistas plásticos, arquitectos, engenheiros, activistas sociais, designers gráficos e os próprios cineastas que quiseram experimentar o vídeo como nova linguagem, para lá das suas preocupações com as películas de 16 ou 35 mm.


A cultura audiovisual aparece, ainda, como um dos eixos estruturantes da vida contemporânea, uma força lúdica, cultural, ideológica que interfere com a nossa concepção do mundo. Ela contém várias facetas: a cinematográfica, a televisiva, a videográfica., a multimédia e o hipermédia, constituindo-se, cada uma delas, em pequenos viveiros de relações restritas mas que só adquirem verdadeira dimensão cultural nos fluxos permanentes que existam entre eles, ligando-os essa substancia primordial, equivalente á água de rega que mantém o viveiro: o bem de consumo.




Imagem: Capa do livro "Guerrilla Television" (Novembro, 1971) - versão em livro da famosa revista sobre uso de video "Radical Software"

quinta-feira, maio 05, 2011

quarta-feira, maio 04, 2011

1

Este ano vamos experimentar quatro datas incomuns: 1/1/11; 1/11/11; 11/1/11; e 11/11/11.


Mais engraçado, ainda, é que: se somares os últimos dois dígitos do ano em que tu nasceste mais a idade que vais ter este ano dá precisamente 111. E isso é para todo e qualquer indivíduo que tenha nascido a partir do ano 1900. E quem tenha nascido precisamente nesta data terá, este ano, exactamente, 111 anos.


Quem tiver esta idade, este ano, e ainda estiver vivo é figura de circo: «The 1 (one)».

segunda-feira, maio 02, 2011

0

Vuk Cosic, ‘ASCII History of Moving Images – Psycho’







NUMA LÁPIDE DE UM TÚMULO QUALQUER LIA-SE:

“Ele nunca se perdoou por ter tido 0 a Matemática.
Soubesse ele que 0 é o mais original dos números.
Não interfere com a divisão, nem com a subtracção de elementos.
Qualquer valor que se queira multiplicar por ele é, logo, anulado.
Ainda que se queira dividir algo pelo seu valor absoluto, torna-se uma impossibilidade.”