Quem vai aos filmes de David Lynch movido pela racionalidade sairá da sala completamente desiludido. Filmada, de forma surpreendente, em formato DV com câmaras caseiras, Inland Empire é a apologia completa da existência de mundos paralelos que funcionam em espiral infinita. A estória de uma mulher perdida e perseguida por alguem que a quer assassinar; um realizador que está a fazer um filme, amaldiçoado, apartir de um conto polaco-cigano; uma dívida que tem que ser paga por uma atriz que procura o estrelato; um caso de adultério que desencadeou um crime passional; algo que se passou na Polónia há muito tempo atrás e que influencia o tempo presente do filme, etc. Estes são alguns dos ingredientes que Lynch juntou para criar um objecto fílmico perturbador e alucinante de 3 horas. Seja qual for a interpretação a que chegar, o espectador tem que levar em conta a sitcom teatral com o casal de coelhos - a mais recente inovação de Lynch na sua galeria de personagens. Neste filme revisita toda a sua filmografia exponenciando o já conhecido efeito onírico no espectador. Retoma a temática de Mulloland Drive do filme dentro do filme e da cena underground /obscura de Hollywood
Mais uma vez não há respostas definitivas quanto áquilo que se deduz do filme e só a própria experiencia de quem vê, interessa. «Basta sentir», refere sempre, David Lynch. Desta vez o cineasta brinca mesmo com essa preocupação contínua das pessoas em querer explicar os seus filmes ao introduzir a sitcom do casal de coelhos cujos diálogos absurdos, acompanhados de risadas, indiciam incompreensão, vaticinios, dúvidas. A certa altura a mulher-coelho aparece a tenta colocar no cenário exiguo do teatro umas luzes que leva na mão (laughing). Talvez por haver um canto da nossa mente em que estamos constantemente a questionar, Lynch o tenha assinalado dessa forma? Ou poderá ser apenas uma simples sitcom de coelhos, nada mais ? Sem pretensões de ordem alguma? Por ser apenas divertido pôr umas criaturas, meio humanos, com cabeças de coelho a proferirem palavras descontextualizadas? Só por ser intrigante!! Bem, só mesmo ele poderá responder a essas perguntas e, como todos os aficcionados da sua obra sabem, isso nunca irá acontecer.
Podemos, pelo menos, descortinar algumas marcas na obra deste cineasta: a sua fixação por bruxas, pelos bastidores do mundo do cinema, por mulheres absurdamente belas e por aquilo (algo sempre hediondo) que se esconde nas traseiras dos edifícios e nos rostos das pessoas aparentemente normais e inocentes. È isso que exerce o fascínio nas películas de Lynch sempre coroadas com uma banda sonora melíflua e uma rara plasticidade das imagens.
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