Uma das novidades dos últimos certames tem sido a presença, em mostras e festivais, das curtas-metragens enquanto modo de expressão critica e ontológica face ao mundo*. As curtas-metragens têm constituído, a nível internacional, nas ultimas décadas, uma possibilidade expressiva com características especificas que a distinguem das longas-metragens. A economia de sentido que lhe está associada impele-o para a busca de novos ângulos de abordagem em relação a um mesmo problema, sem ser a mera preocupação em contar um enredo.
Uma curta pode ir de 5 a 55 minutos e não será pela duração que ganha a sua especificidade, mas pela capacidade de síntese e de exegese que ela alberga. Uma simples cena no interior de uma casa pode ser altamente gratificante enquanto cinema, se ao espaço juntarmos a tensão que o tempo provoca e o insólito. Nada é mais certo do que isso numa curta-metragem: buscar o insólito e representá-lo. Mas o desejo de encena-lo não deve sobrepor-se às contingências da produção. O cineasta só deverá contar consigo próprio, no que toca às ideias, à operacionalidade da câmara e do material áudio, porque cada um desses elementos é um elemento estilístico na abordagem que se faz a uma dada matéria. Uma curta-metragem, sobretudo no género ficção, é a única via para o cineasta que pensa realmente trilhar os caminhos da ficção cinematográfica, tout court. É provavelmente o único género cinematográfico através do qual se deve olhar fundamentalmente para a questão da autoria (como ela é entendida na literatura).
* É o caso de “Trompe D’Oeil” de Mário Vaz Almeida (o autor deste blogue), curta-metragem que se debruçou sobre a questão universal da visibilidade, dos sonhos, das suas repercussões nas nossas vidas, e “Blimunde” (a) de Tambla Almeida, que se apoiou num registo mais autóctone sobre a questão da seca que assola as ilhas e o destino dos homens, radicando-a, consciente ou inconscientemente, numa figura mitológica.
(a) Onde se lê "Blimunde" leia-se "Ulime".
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