Leão Lopes - "São Tomé - Os Útimos Contratados" - Preparação de entrevista a Alda Espírito Santo - Setembro 2009
Em que condições técnicas de produção, rodagem e pós-produção o documentário “S. Tomé - Os Ultimos Contratados” foi realizado?
Como surgiu a parceria com a Plataforma das ONG’s em Cabo Verde?
A Plataforma apenas se ocupou da realização da estreia na Praia e em S. Vicente, contribuindo para trazer alguns dos participantes no filme que estiveram presentes na estreia na cidade do Mindelo. Uma importante contribuição da Plataforma e do Cônsul de Cabo Verde em São Tomé, determinante para que o filme tivesse o impacto e bom acolhimento que teve em Cabo Verde.
Recebeu algum apoio do Instituto das Comunidades (MNECC) neste projecto?
Não. Que diria da terminologia “documentário de criação” utilizada para definir esse seu ultimo trabalho e o anterior - “Bitú”? Creio que todo o documentário é de criação, apesar do seu carácter documental e expositivo e desde que não se confunda com grande reportagem. Todavia, acho interessante a terminologia “documentário de criação” que, talvez queira propor uma abordagem do documentário mais livre e que pode oferecer ao realizador imensas possibilidades tanto ao nível da narrativa como dos recursos de linguagem fílmica. Um filão a explorar.
Quais são as suas influências /referências no cinema e documentário internacionais?
Seria uma banalidade dizer que todo o bom cinema seja ficção ou documentário são referências podendo ser muito bem influências no sentido de procura de uma linguagem. Não tenho influências objectivas por esta razão, são as boas obras e os bons autores a minha escola, a minha aprendizagem. Desde a proposta estética do Eisenstein, passando pela inteligência da narrativa de Chaplin à desconstrução de Felini, ou à poesia de certos filmes de Almodovar, à irreverência do Woody Allen, ao lirismo de Kurosawa, todos representam o meu universo de culto e aprendizagem. Quanto a documentários tenho uma experiência muito relativa, conheço muito pouco da história do documentário e consequentemente os seus autores mais relevantes. Na verdade, o documentário para mim é terreno ainda de muita aprendizagem. Recentemente descobri o documentário cubano e brasileiro aquando de uma vista a Cuba e ao Brasil. Fiquei muito impressionado pela qualidade das obras que me foram dadas a conhecer. Alías, tanto as políticas públicas para o cinema como a produção cinematográfica destes dois países são incontornáveis referências para nós.
Temos hipótese para ter, num futuro próximo, uma cinematografia nossa, de relevância? Sendo o nosso país de vocação dominantemente literária?
Não creio, pelo menos tão cedo. Não temos visão política neste domínio, tanto no plano educativo como no de produção. Teríamos alguma possibilidade dada pela história deste país e pela sua diversidade cultural.
Destacamos aqui a figura incontornável de Leão Lopes que já foi, uma vez, Ministro da Cultura, por considerá-lo, sem margens para a dúvida, o “Pai” da moderna cultura cabo-verdiana audiovisual e cinematográfica. Essa entrevista vem na sequencia da produção do filme “S. Tomé - Os Ultimos Contratados”.
Em que condições técnicas de produção, rodagem e pós-produção o documentário “S. Tomé - Os Ultimos Contratados” foi realizado?
As condições de produção foram mínimas, mas eficazes. Consistiram numa viagem prévia de preparação no terreno e estabelecimento do roteiro e na montagem financeira do projecto. A rodagem realizou-se em boas condições com suficientes meios locais de produção e uma pequena equipa com elementos ha-bituados a trabalhar juntos. Os meios de equipamentos foram reduzidos, mas suficientes e adaptados às circunstâncias; interior de S. Tomé, com alguns acessos difíceis e clima instável na ocasião. Quanto à pós-produção, tenho referido que foi facilitada e muito, pelo facto de a ter realizada no país, com meios próprios e de M_EIA, a escola superior de Arte a que estou ligado.
Como surgiu a parceria com a Plataforma das ONG’s em Cabo Verde?
A Plataforma apenas se ocupou da realização da estreia na Praia e em S. Vicente, contribuindo para trazer alguns dos participantes no filme que estiveram presentes na estreia na cidade do Mindelo. Uma importante contribuição da Plataforma e do Cônsul de Cabo Verde em São Tomé, determinante para que o filme tivesse o impacto e bom acolhimento que teve em Cabo Verde.
Recebeu algum apoio do Instituto das Comunidades (MNECC) neste projecto?
Não. Que diria da terminologia “documentário de criação” utilizada para definir esse seu ultimo trabalho e o anterior - “Bitú”? Creio que todo o documentário é de criação, apesar do seu carácter documental e expositivo e desde que não se confunda com grande reportagem. Todavia, acho interessante a terminologia “documentário de criação” que, talvez queira propor uma abordagem do documentário mais livre e que pode oferecer ao realizador imensas possibilidades tanto ao nível da narrativa como dos recursos de linguagem fílmica. Um filão a explorar.
Quais são as suas influências /referências no cinema e documentário internacionais?
Seria uma banalidade dizer que todo o bom cinema seja ficção ou documentário são referências podendo ser muito bem influências no sentido de procura de uma linguagem. Não tenho influências objectivas por esta razão, são as boas obras e os bons autores a minha escola, a minha aprendizagem. Desde a proposta estética do Eisenstein, passando pela inteligência da narrativa de Chaplin à desconstrução de Felini, ou à poesia de certos filmes de Almodovar, à irreverência do Woody Allen, ao lirismo de Kurosawa, todos representam o meu universo de culto e aprendizagem. Quanto a documentários tenho uma experiência muito relativa, conheço muito pouco da história do documentário e consequentemente os seus autores mais relevantes. Na verdade, o documentário para mim é terreno ainda de muita aprendizagem. Recentemente descobri o documentário cubano e brasileiro aquando de uma vista a Cuba e ao Brasil. Fiquei muito impressionado pela qualidade das obras que me foram dadas a conhecer. Alías, tanto as políticas públicas para o cinema como a produção cinematográfica destes dois países são incontornáveis referências para nós.
O que é que pensa do trabalho de Michael Moore?
Nunca vi nenhum trabalho de Michel Moore, mas tenho lido muita coisa sobre o seu trabalho e sobre seu espírito crítico, acutilante, em relação à política e monopólios americanos. Fascina-me no Moore o activista, a sua coragem e frontalidade. Já vi uma entrevista dele na televisão onde fiquei a conhecer um pouco das suas motivações enquanto realizador. O Atelier Mar tem vindo a desenvolver uma série de acções de grande importância para a cultura nacional, que extravasa as produções audiovisuais e artísticas para se situar, por exemplo, na questão dos problemas ambientais, culturais, etc. Na sua óptica qual é o lugar do Atelier Mar relativamente às outras instituições \ organizações cabo-verdianas que se têm dedicado a transformar a face da nossa cultura. O Atelier Mar, assim como outras ONG’s nacionais têm des-empenhado um papel interessante na sociedade caboverdeana. O Atelier Mar, na verdade, actua especialmente no domínio da cultura enquanto motor de desenvolvimento de pessoas, de colectivos ou comunidades, em várias frentes: educativas, culturais, investigação, arte, economia e tecnologias alter-nativas várias. O lugar do Atelier Mar será aquele que a sociedade caboverd¬iana o reconhecer enquanto ONG empenhada no desenvolvimento do nosso país.
Nunca vi nenhum trabalho de Michel Moore, mas tenho lido muita coisa sobre o seu trabalho e sobre seu espírito crítico, acutilante, em relação à política e monopólios americanos. Fascina-me no Moore o activista, a sua coragem e frontalidade. Já vi uma entrevista dele na televisão onde fiquei a conhecer um pouco das suas motivações enquanto realizador. O Atelier Mar tem vindo a desenvolver uma série de acções de grande importância para a cultura nacional, que extravasa as produções audiovisuais e artísticas para se situar, por exemplo, na questão dos problemas ambientais, culturais, etc. Na sua óptica qual é o lugar do Atelier Mar relativamente às outras instituições \ organizações cabo-verdianas que se têm dedicado a transformar a face da nossa cultura. O Atelier Mar, assim como outras ONG’s nacionais têm des-empenhado um papel interessante na sociedade caboverdeana. O Atelier Mar, na verdade, actua especialmente no domínio da cultura enquanto motor de desenvolvimento de pessoas, de colectivos ou comunidades, em várias frentes: educativas, culturais, investigação, arte, economia e tecnologias alter-nativas várias. O lugar do Atelier Mar será aquele que a sociedade caboverd¬iana o reconhecer enquanto ONG empenhada no desenvolvimento do nosso país.
Pensa abraçar definitivamente o documentário como modo de expressão estético-moral ou pondera ainda aventurar-se pela ficção?
Faço cinema “adjectivamente”, como diria Baltasar Lopes, pelo que não produzo este tipo de determinismo. Contudo, continua a interessar-me o documentário como um modo de expressão, uma oportunidade de indagar para conhecer, uma forma de actuar com imensas possibilidades de se insta¬lar nestas ilhas, enquanto produto cultural de excelência.
Faço cinema “adjectivamente”, como diria Baltasar Lopes, pelo que não produzo este tipo de determinismo. Contudo, continua a interessar-me o documentário como um modo de expressão, uma oportunidade de indagar para conhecer, uma forma de actuar com imensas possibilidades de se insta¬lar nestas ilhas, enquanto produto cultural de excelência.
“Ilheu de Contenda” foi o seu primeiro trabalho enquanto realizador e o único em género ficção. Como foi trabalhar com Paulo Sousa, nessa altura?
Foi grato trabalhar com Paulo de Sousa. Ele confiou em mim e investiu muito no filme, a todos os níveis, incluindo na determinação de que”Ilhéu de Contenda” se faria apesar das pedras vindas especialmente de alguns “bons” caboverdeanos que tudo fizeram para que o filme não se realizasse. Toda a gente deve estar lembrada daquela “conheço Felini, conheço Kurosawa, mas quem é Leão Lopes”? O mal dissente que parecia conhecer estes grandes nomes do cinema, afinal não conhecia nada. A única verdade contida nessa diatribe era que de facto não conhecia Leão Lopes. Porque se o conhecesse tinha tudo para o aproximar da história destes criadores, que tal como Leão Lopes, fizeram um dia o seu primeiro filme; tal como Leão Lopes, foram artistas plásticos antes do cinema e continuaram sendo; que os três entraram no cinema pelos mesmos caminhos. Mas Leão Lopes tinha tudo a perder; não nasceu na Itália, nem na China. Pagou caro por ter ousado fazer um filme na sua terra. Pena é que nunca tenha sido possível fazer-se a estreia do filme na Praia, nem nunca a nossa televisão passou a série que produzi para esse formato e realizado em simultâneo ao filme, de 3 episódios de 50 minutos cada. Os cabo-verdianos nem sabem que “Ilhéu de Contenda” foi premiado algumas vezes lá fora, incluindo no Fespaco (melhor música), que teve sua banda sonora editada, entre outras apreciações que mereceu durante a seu percurso. Também nem deram conta que na primeira edição do festival de cinema de Francisco Manso realizado em Cabo Verde, o filme não foi seleccionado.
Foi grato trabalhar com Paulo de Sousa. Ele confiou em mim e investiu muito no filme, a todos os níveis, incluindo na determinação de que”Ilhéu de Contenda” se faria apesar das pedras vindas especialmente de alguns “bons” caboverdeanos que tudo fizeram para que o filme não se realizasse. Toda a gente deve estar lembrada daquela “conheço Felini, conheço Kurosawa, mas quem é Leão Lopes”? O mal dissente que parecia conhecer estes grandes nomes do cinema, afinal não conhecia nada. A única verdade contida nessa diatribe era que de facto não conhecia Leão Lopes. Porque se o conhecesse tinha tudo para o aproximar da história destes criadores, que tal como Leão Lopes, fizeram um dia o seu primeiro filme; tal como Leão Lopes, foram artistas plásticos antes do cinema e continuaram sendo; que os três entraram no cinema pelos mesmos caminhos. Mas Leão Lopes tinha tudo a perder; não nasceu na Itália, nem na China. Pagou caro por ter ousado fazer um filme na sua terra. Pena é que nunca tenha sido possível fazer-se a estreia do filme na Praia, nem nunca a nossa televisão passou a série que produzi para esse formato e realizado em simultâneo ao filme, de 3 episódios de 50 minutos cada. Os cabo-verdianos nem sabem que “Ilhéu de Contenda” foi premiado algumas vezes lá fora, incluindo no Fespaco (melhor música), que teve sua banda sonora editada, entre outras apreciações que mereceu durante a seu percurso. Também nem deram conta que na primeira edição do festival de cinema de Francisco Manso realizado em Cabo Verde, o filme não foi seleccionado.
Temos hipótese para ter, num futuro próximo, uma cinematografia nossa, de relevância? Sendo o nosso país de vocação dominantemente literária?
Não creio, pelo menos tão cedo. Não temos visão política neste domínio, tanto no plano educativo como no de produção. Teríamos alguma possibilidade dada pela história deste país e pela sua diversidade cultural.
Voltando ao seu último trabalho “S. Tomé - Os Ultimos Contratados”: sendo o filme vanguardista revela também o seu mundo interior quando conduz o problema ao campo da expressão artística (música e poesia) em vez de seguir o social «ritualizado» no quotidiano são-tomense com todos os seus problemas actuais. Concorda com esta afirmação?
Concordo. Tenho referido que “S. Tomé” é bastante intimista, não é um relato, é um mergulho muito dentro de nós caboverdeanos. Não fui para o terreno com esta intenção, deliberada. Fui com uma certa bagagem de conhecimento do problema e um itinerário esboçado impelido pela urgência de voltar a estar com aquele gente, desterrada, sem culpa. O filme foi escrito com a câmara em cima daquele drama de que eu próprio faço parte. “S. Tomé” sou eu também.
Concordo. Tenho referido que “S. Tomé” é bastante intimista, não é um relato, é um mergulho muito dentro de nós caboverdeanos. Não fui para o terreno com esta intenção, deliberada. Fui com uma certa bagagem de conhecimento do problema e um itinerário esboçado impelido pela urgência de voltar a estar com aquele gente, desterrada, sem culpa. O filme foi escrito com a câmara em cima daquele drama de que eu próprio faço parte. “S. Tomé” sou eu também.
[Entrevista realizada a 08 Junho de 2010]
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