De finais dos anos 80 à década de 90, nas primeiras horas do vídeo e da televisão cabo-verdianas, uma larga fasquia da produção audiovisual limitava-se a pequenos concertos musicais e teatros filmados. A Juventude em Marcha sobreviveu às gerações de grupos teatrais e ganhou espaço numa área de negociação com a linguagem audiovisual originando o teatro filmado, como se de um género autónomo se tratasse. O grupo "Fladu Flá", na mesma senda, tem sido o principal impulsionador do género. Basicamente o que os criadores fazem é encenar, teatralmente, as acções, sem se preocuparem com a continuidade material e dinâmica dessas acções (caras ao cinema), dando mais atenção às caracterizações e ao texto dramático.
Assistimos, no mês de Março e Abril de 2010, a um recrudescer do teatro como género, com a entrada em cena de um novo grupo Otaca, com gags fortes sobre a condição do homem cabo-verdiano na sua labuta por outras paragens e na sua luta diária com as intempéries de um país transformado por dentro. Todavia, se é nos palcos e auditórios que o teatro triunfa assistira-se, na recta final do ano 2009, a um trabalho que desafiou as convenções do género: João Branco apresentava “No Inferno”, com uma banda sonora pungentemente cinematográfica de Caplan Neves, num registo raro de junção de aparato teatral (encenação, cenografia e figurinos) com a “vontade” de cinema, qualificando assim o melhor meio artístico cabo-verdiano com aquilo que gostaríamos de ver e ouvir em imagens montadas num ecrã. Uma reinvenção do cinema, pelo teatro, no mais secreto dos pactos entre géneros primos.
Contrariamente ao teatro, no qual se cultivam as colaborações e entreajudas, no sector mais avançado do meio artístico audiovisual prevalece a prática daquilo que Marguerite e Willard Beecher chamam de “courtship dancing” : uma forma prevalente e altamente irritante de não - cooperação. O “courtship dancer” está sempre tentando afastar os outros do seu percurso, impedindo-o de avançar com a iniciativa. Muitas “experiencias de cinema” detiveram-se nesse murro invisível, levantado no meio de um salão onde todos os dançarinos, movidos pelo desejo, esbarram, ao procurarem a melhor forma de chegar ao primeiro prémio. Algumas dessas “experiencias de cinema” não conseguiram passar de um único filme e outros não chegaram a passar de uma curta-metragem singela, com marcas de produção precária.
Acrescente-se a isso a eterna querela cultural e artística que mantém Mindelo como refém das transformações políticas e regionais, enquanto se assiste a algum “desequilíbrio” pontificante no meio social e artístico da cidade de Praia que, mesmo sendo o centro dos poderes políticos e culturais, está atravancado com mazelas da história e estigmas vários que deixa, na difícil arena sócio – política, poucas hipóteses de superação à iniciativa individual, em permanente combate desigual contra aquilo que já está enraizado na mentalidade de um povo, há séculos.
Não raro, encontramos ali uma certa franja “curiosa” do universo audiovisual cabo-verdiano como aquele núcleo de apaixonados e amadores que, imbuídos do espírito do atelier e do chamado work in progress, vão fazendo as suas experimentações a nível da técnica .
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