Em termos epistemológicos, é mais sensato que se coloque a questão de uma autoconsciência que reflecte durante o acto de pintar do que aquela que, supostamente, existirá no cinema, uma vez que, neste meio artístico, o trabalho de equipa e as contingências de uma produção condicionada por todos os meios acarretam uma dificuldade essencial em capturar o instante. Face a isto é que se compreende o esforço do cinema de Robert Bresson na consecução de uma imagem capaz de recuperar o valor do cinematográfico (termo que o próprio prefere, por oposição ao de cinema). No original Notas sobre o Cinematógrafo , publicada em 1975, Bresson coloca as questões concretas que surgem durante a rodagem de um filme e expõe uma determinada teoria cinematográfica que estabelece uma certa autoconsciência realista caracterizada por uma abertura à invisibilidade e à verdade interior das imagens. Numa das passagens desta obra singela, Bresson faz a seguinte afirmação:
«Pôr o público frente a seres e coisas, não como é posto arbitrariamente por hábitos adquiridos (clichés) mas como te situas tu mesmo de acordo com as tuas impressões e sensações imprevisíveis. Nunca decidir nada antecipadamente.» (Bresson, 2000: p.81).
Nesta citação está implícita o privilégio que é dado a uma espécie de cogito cartesiano, aquele que reflecte desde uma interioridade incondicionada, diferentemente de um demiurgo que tudo decide, que tudo condiciona, alheio ao mundo real.
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