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segunda-feira, fevereiro 19, 2007

Touro Indomável

Exuberante. Sensacional. Espectacular! Estes têm sido alguns dos adjectivos utilizados para qualificar “Touro Indomável”, considerado o melhor filme dos anos 80 e que se baseia num livro auto-biográfico sobre a vida do boxeur Jake La Motta.

Rodado por altura em que o próprio Scorsese travava uma luta pessoal para se livrar do vício da cocaína o filme se, analisado de forma superficial, transmite a ideia de que é a intenção do realizador é meramente fazer com que o protagonista Jake (Robert De Niro) desconte nos outros as surras que a vida lhe dá. Mas o que acaba por sobressair durante o longa não são os combates dentro do ringue, magistralmente filmados por Scorsese, mas sim, as constantes derrocadas de Jake fora dele.

“Touro Indomável” é um retrato demolidor do que pode acontecer a um ser humano quando se deixa consumir pela paranóia e, por essa razão, passa a não confiar naqueles que o rodeiam e zelam pelo seu bem.

Apesar de se tornar rico e famoso, ter um irmão e uma namorada que o amam, duas perguntas vêm à tona constantemente no decurso do filme: por que é que a vida familiar de Jake é um inferno permanente quando tem tudo para ser de outra forma? É possível ajudar alguém que não reconhece que precisa de ajuda? É no processo de construção das respostas para estas questões que reside o grande trunfo e lição do filme: um homem pode cair num ringue e se levantar, mas quando começa a cair por dentro de si mesmo pronto, o caminho da auto-destruição está encontrado.

Ao longo do filme que, conta com uma direcção impecável de actores, acabamos por perceber que para Jake a luta mais difícil não é aquela que ele trava contra os seus adversários que vai destroçando, um a um no ringue, com seu talento.

Ela é essencialmente contra os fantasmas derivados de seus complexos psicológicos (que o levam a pensar que é capaz de resolver tudo sozinho e à sua maneira) e sexuais (que o levam a agredir violentamente o próprio irmão por supor que ele anda a seduzir sua amada). E Jake acaba por pagar um pesado tributo nesta sua luta inglória contra inimigos sem rosto: passa da degradação moral à física e, de Ícaro que um dia chegou perto do sol, termina seus dias como contador de piadas em casas nocturnas.
“Touro Indomável” é definitivamente uma lição de boxe e de vida, um soco no estômago na ilusão da auto-suficiência humana. Aliás, Scorsese defende que “o maior dos pecados é o orgulho”.
Texto de Jorge Garcia

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