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quarta-feira, julho 27, 2011

POLÍTICA CABOVERDEANA

NO COUNTRY FOR YOUNG MAN

Ilha de Utoya. "Há qualquer coisa naquelas matas...!" Pensa o jovem Vijnick para consigo. Minutos depois um relampejo de luz desponta por entre os arbustos ... um estampido seco de um rifle automático... ao jovem Slojdick, que estava a contar uma piada, morre-lhe o sorriso no rosto quando vê o peito do amigo explodir literalmente, abrindo uma cratera... segundos depois é ele que sente o fogo flamejar dentro de si e o corpo a cair inexoravelmente para traz, no vazio ... a humanidade morre com ele...porque, nesse instante, o que sai daquelas matas já não é humano...

segunda-feira, julho 25, 2011

UMA ONG AFRICANA PARA AS ARTES

Até há bem pouco tempo, quando se ouvia falar de ONG's pensava-se, de imediato, em problemas sociais (delinquência, desigualdades, etc). Mas de uma ONG para as Artes é que, ainda, ninguém tinha ouvido falar. Pois já temos, no solo caboverdeano, a Arterial Network Cabo Verde. Trata-se de uma representação, no nosso pais, da Arterial Network, uma rede continental, que emerge e actua na sociedade civil e é composta por artistas, artesãos, empresas culturais músicos, grupos de dança, grupos de teatro, escritores, artistas visuais e cineastas.

Esta iniciativa megalómana vem da África do Sul, na cidade de Cabo, e está comprometida, por um lado, com a prática qualitativa da arte enquanto arte, e, por outro lado, está, profundamente, envolvida numa luta sem tréguas para a eradicação da pobreza, pelos direitos humanos e pela democracia no continente africano. Aparece, também, naturalmente, ligado àquilo que se entende por economia criativa contrapondo-se à ideia de «indústrias culturais» (terminologia saída da Escola de Frankfurt de Adorno e Horkheimer), ou seja, trata-se de instaurar princípios e dinâmicas económicas ao campo das artes, incorporando exposições de venda, sponsors e agentes culturais comprometidos com a pequena produção activa dos artistas e artesãos.

Hoje, a “criatividade” é uma palavra-chave e afasta-se da ideia de “indústrias culturais,” Internacionalmente foi utilizada pelo Conselho da Grande Londres (Greater London Council), no começo da década de 1980 (DUISENBERG, 2009). Segundo os analistas essa mudança discursiva deve-se ao facto da ideia de «criatividade» integrar, por exemplo, o artesanato que, às vezes, aparece excluído da abrangência das indústrias criativas. Cabo Verde beneficia muito com essa prática discursiva (desde 2000) pois o seu desenvolvimento cultural nunca esteve dissociado do turismo cultural.

Com a Arterial Network Cabo Verde, associação panafricana, estamos, assim, perante um conjunto de procedimentos / prácticas artísticas e discursivas de peso que podem reconfigurar, internamente, o sector das artes trazendo à tona todo o manancial e potencial criativo de jovens artistas e artesãos, ao mesmo tempo que os internacionaliza.


De notar aqui que a Arterial Network, organização-mãe, fará a sua primeira conferência anual continental sobre a Economia Criativa, em Setembro 2011, que coincide com a sua terceira conferência bianual. Segundo informações da rede «os objectivos dessa conferência são de fornecer uma visão global teórico e estatístico da economia criativa africana como uma base com fins de intervenções futuras e de plaidoyer, assim como de identificar e desenvolver uma especialização africana nesse domínio».

sexta-feira, julho 22, 2011

A PRODUÇÃO E A "VIDEO-IDIOTIA"

A propósito do esforço natural em traduzir o que nos vai na alma e na mente, trazemos, aqui, a expressão “tempos barrocos” introduzida por J.F. Lyotard (1984) relativamente à uma definição complementar que associa “psico-cultura” à nossa própria condição pós-moderna: uma “psicocultura” do happening, do viver dia-a-dia, da ausência de “meta-narrativas”, algo que está na base da nova vaga de «video-idiotia» que circunda o meio artístico.

José Angel Lopez Herrera (2000) levou às últimas consequências esta problemática, ao afirmar que esse tempo psico-cultural do pós-modernismo, presente na nossa personalidade, encontrou, nos media, o meio mais útil para manter e nutrir a situação de forma aparente, mas “radicalmente mentirosa”. Para Lopez Herrera “os media são os instrumentos intuitivos permanentes, sugestivos e animadoras que, gerando uma sensação de liberdade, já que apelam a estruturas superficiais da personalidade, realmente nos submetem embasbacadamente às suas linguagens, interesses, crenças, ideias, que interessam a certos grupos de poder.” (HERRERA: 2000).

O pós-moderno “com estilos de particularidade, superficialidade e absoluta relatividade ao momento” leva-nos a procurar outros caminhos psico-culturais para construir outras identidades, com outras possíveis e efectivas linguagens.” Nesta situação particular, Herrera propõe a criação de irmandades, em diversos domínios da criação. Trata-se, no nosso entender, de uma nova postura intelectual que se abre à uma maior prospecção aos fenómenos culturais e sociais e aos valores universalistas.


O novo “expedicionário” do vídeo terá, assim, forçosamente, que evitar relacionamentos lineares; desfazer o medo de “umbrais” de sentido; tomar como natural as contingências da nossa produção nacional, que devem ser vistas como simples etapas a ultrapassar; buscar uma maior capacitação tecnológica; evitar estribilhos como aquele de que o povo cabo-verdiano só tem apetência para a música; e trilhar os caminhos da ficção cinematográfica, aventurando-se por essa nova possibilidade expressiva para, assim, entrar num novo ciclo. Para isso alguns pré-requisitos deverão ser levados em linha de conta: se houver, como propõe Herrera, a criação de irmandades em diversos domínios da criação; se emergir a consciência de que o trabalho de equipa é muito mais importante que a obsessão individual e o laxismo; e que o correcto ajuizamento é de que uma criação nunca é completamente original e individualizada.

Cumpridas estas condições as coisas poderão melhorar significativamente no meio artístico que se avizinha. Home videos e pequenas produções terão, certamente, o seu devido valor enquanto arte e afirmação no seio de uma camada juvenil que já não quer tanto ler ou escrever mas, sim, filmar.

quarta-feira, julho 20, 2011

A LITERACIA MEDIÁTICA E OS EXPEDICIONÁRIOS DA VÍDEOSFERA (3)

"Grizzly Man" (2005). Werner Herzog

Tratando-se de uma busca activa em relação às narrativas audiovisuais (cinema e documentário) a consciência dos “futuros expedicionários” irá, provavelmente, no sentido de controlarem os efeitos de risco na constante exposição a conteúdos de natureza experimental. À medida que aumenta o factor de risco para a correcta interpretação cultural dos processos nela inscritos diminuirá o interesse em inovar no conteúdo. Hipóteses ou certezas, sabe-se para já que a quantidade de ofertas da tecnologia de edição disponíveis on line, para download, supera, em larga medida, a quantidade de câmaras na posse de jovens amadores do vídeo.

Na lógica de consumo que impera nas nossas modernas sociedades, há mais hipótese de um jovem se apoderar de um vídeo pré-fabricado na internet e recria-lo com base numa tecnologia de edição baixada na internet do que se entregar às complexidades de uma produção bem planificada com adereços e actores, ainda que seja no plano amador. O que se assiste, a esse nível, extravasa a questão ética e deontológica, para tocar os meandros da criminalidade: posse de bens produzidos por outrem e sua distorção ou desvio, numa lógica de experimentação naif irresponsável. Para além disso, o seu esforço de transformação estética acaba por incidir mai, nos aspectos formalistas da obra.

Consideramos que alguns dos nossos videastas (leia-se "futuros expedicionários") detêm uma vaga consciência das investidas intelectuais que fazem e acreditam ser isso um factor aditivo ao seu trabalho. È que, por vezes, a alta exposição à factores de risco, a nível dos recursos estilísticos e intelectuais, pode trazer mais perturbação à sua reflexão enquanto criativos, o que os leva a buscar com naturalidade zonas mais ou menos seguras de reflexão crítica e identitária.

terça-feira, julho 19, 2011

"LÁGUA E KONBERSU D'ALMA" ENEIDA KELLY

Estas palavras estão no blogue da jovem poetisa Eneida Kelly que parece nos falar de além mar, desde a eternidade até ao presente do seu desaparecimento físico. Com isso rendemos uma sentida homenagem a esta jovem poetisa.



"O ENIGMA DA MENTE DE UM JOVEM...

Trovejada de ilusões, desde tenra idade que a juventude vem sendo o âmago,o cerne do caminhar de uma vida. Quer para o ontem como também para o amanhã.
Na flor da idade em que a enquimose domina a razão, que emerge do enigma da mente de um jovem é a sua entrança triunfante pelo erguer da vida ou da sua derrocada,a diplacusia da frustração.
Sem querer provar o que Sigmund Freud citou na psicanálise e nem contestar os cincos degraus de Jean Piaget, decifrar essa máquina tão bem montada é um segredo que vencerá milénios.
Mas, a meu ver, no meio onde cresci esse caminho é bem mais curto!
Fez-me aprender a culminar pelo puro sentir. Sentir o peso da incerteza de um bálsamo,das sementes que brotam as dúvidas...Na ausência de um condimento da vida nas cinzas das horas conducentes, pode um jovem sem armas aparente flabelar o seu vazio e abraçar o seu amanhã.
Mas também pode incumbir-se na inoportunidade conceptuada, uma vez que a oportunidade se cria e jamais se espera, com o único intuito de ser um flagelado de ontem que desistiu do amanhã.
Como decifrar quais dos casos é para cada caso?
Até que ponto isso afecta ou compromete o nosso país é que é preciso pensar."

Fonte: Blog "Lágua é Konbersu d'Alma" de Eneida Kelly: Aqui

NOTÍCIA: Laboratórios Éclair restauram “Les Enfants du Paradis” em 4K

Usando a tecnologia da empresa Image Systems, antiga Digital Vision, os laboratórios franceses de cinema e serviços digitais Éclair usaram o seu sistema Phoenix Refine para efectuar um restauro completo do clássico filme “Les Enfants du Paradis” em master 4K. Desta forma, fica preservado para futuras gerações um dos grandes filmes clássicos franceses dos anos 40, realizado por Marcel Carné e filmado em Paris e Nice durante a ocupação alemã da Segunda Guerra Mundial.

Em 1995, este filme foi votado como “O Melhor Filme Francês de Sempre” por cerca de 600 críticos e profissionais de cinema. A obra restaurada em glorioso master digital 4K foi apresentada este ano no festival de Cannes e no festival de Bolonha (Il Cinema Ritrovato). O filme tem uma duração superior a três horas, dividindo-se em duas épocas: “Boulevard du Crime”, que decorre em meados de 1820; e “Le Homme Blanc”, sete anos mais tarde.

O projecto de restauro desta obra foi considerado vital dada a condição física em que se encontrava o negativo, propriedade dos estúdios Pathé, correndo perigo de se desfazer e nunca mais poder ser recuperado. Quando chegou aos laboratórios da Éclair, o filme negativo original estava em 11 latas de filme, com aproximadamente 2000 pés de material. A equipa da Éclair deparou-se com uma série de desafios à medida que tiveram de lutar contra os danos provocados pela humidade e mofo, assim como frames perdidos, um enorme desgaste e lágrimas. Dada a popularidade que o filme teve na sua época, tinha também sido várias vezes copiado o que contribuiu para aumentar os danos.Utilizando mais duas cópias positivas existentes em arquivo, a equipa da Éclair foi capaz de reconstruir o filme na sua totalidade.

O filme foi digitalizado em 4K em Itália e enviado para a Éclair em disco. Inicialmente a Éclair utilizou a ferramenta de estabilização Phoenix Refine e depois aplicou um filtro para resolver alguns dos problemas mais simples tais como sujidades e poeiras em cada frame. A seguir recorreram um segundo filtro para remover riscos, após o que utilizaram as ferramentas de auto fix e pintura para reparar, efectuar retoques e remover outras imperfeições. (...)"Aqui.

Ver ainda:
www.eclair.fr www.imagesystems.tv www.decimagem.pt


LITERACIA MEDIÁTICA E OS EXPEDICIONÁRIOS DA VIDEOSFERA (2)

Segundo James Potter (2004) os construtores de conhecimento são motivados pela necessidade de obter informações particulares que deverão fazer parte de um corpus de conhecimentos pré-adquiridos. Uma vez satisfeita essa necessidade específica não fica nenhuma outra motivação em voltar novamente ao mesmo tipo de mensagens, quase nunca se expondo, de modo ritualizado, ao carácter degradante de alguns programas de mau gosto. Os “futuros expedicionários”, nesta categoria, não estarão preocupados com o facto de puderem encontrar coisas que entrem em desacordo com a sua visão do mundo. Pelo contrário, preferirão deparar-se com mensagens que contradizem essa visão fortalecendo, deste modo, a sua posição de desafio em reconciliar e sintetizar informações. Objectos audiovisuais polémicos e arrojados poderão resultar desse tipo de motivações.

Os conformistas ritualizados são, no entender desse autor, motivados por rituais, focalizando-se em determinadas narrativas. Eles se apoiam apenas em mensagens que apoiam a sua crença, visão do mundo e posições políticas. Prevenidos, raramente encontram mensagens que vão de encontro à sua necessidade e sentem que nunca é demais estarem expostos às mensagens que apoiam as suas crenças. A sua capacidade de produção crítica é, como tal, limitada.

Os redutores da dissonância são motivados apenas por narrativas que contribuam para reduzir uma certa carga negativa ou uma incerteza ocasional. Não se sentem impelidos a voltar novamente àquele tipo de narrativas que costuma apoiar as suas posições. Uma vez resolvida uma certa dissonância na sua visão das coisas já não resta aquela motivação em obter outros inputs visionários. Aquele que decidisse trilhar os caminhos da criação audiovisual e cinematográfica colocar-se-ia, imediatamente, na esfera de influenciador e estaria capacitado a elaborar produtos audiovisuais mais seguros e lúcidos do que a maioria.

Os géneros “junkies” são, por sua vez, motivados por necessidades ritualistas de atender à vários tipos de mensagens ou narrativas, tais como, novos programas. Regra geral, vêem um canal de desporto todas as tardes de sábado, por exemplo. A sua devoção vai mais no sentido de estarem bem com qualquer tipo de mensagem mesmo que isso lhes cause dissonância. Nesta esfera estão os crónicos seleccionadores de filmes e documentários submergidos numa lógica de consumo inexorável, o que impede, relativamente, a emergência de um espírito crítico e de produção de outras narrativas que deveriam, em princípio, reforçar a memória e o saber já existentes. Consoante o grau de consciência dos nossos expedicionários assim se torna a sua atitude mental e a propensão face ao material visionado: do consumo passivo à busca activa e produção efectiva.

segunda-feira, julho 18, 2011

A LITERACIA MEDIÁTICA E OS EXPEDICIONÁRIOS DO VÍDEO (1)

Dziga Vertov nas filmagens de "Entusiasmo" (Rússia, 1930)

Sabe-se que o nível de literacia mediática aumenta à medida que nos tornamos produtores ou realizadores. Num extremo, temos essa camada social que possui fracas estruturas de conhecimento, ou que praticamente desconhece, de todo, a linguagem e as técnicas audiovisuais, e, no extremo oposto, encontramos os futuros activos expedicionários que possuem uma forte estrutura de conhecimento, para além de terem contactos iniciais, amadorísticos ou profissionais com softwares de edição ou com câmaras de vídeo. Interessa-nos aqui este último grupo. Consoante a sua atitude perante os temas audiovisuais, estes elementos são motivados por necessidades específicas que variam de acordo com o seu grau de interesse e motivação. A sua oscilação entre a produção activa ou o consumo passivo é que determinará o futuro do audiovisual cabo-verdiano.

Num interessante estudo sobre esta matéria o investigador James Potter, na sua obra “Theory of Media Literacy” faz uma extensa análise sobre o grau de literacia mediática de um determinado público-alvo restrito de consumidores do medium televisivo, e que, no nosso caso, identificamos como sendo “futuros expedicionários” da videosfera: um grupo de amadores da arte do vídeo e da publicidade. O referido autor classificou em quatro (4) categorias a literacia mediática: os (1) construtores de conhecimento, (2) os conformistas ritualizados, (3) os redutores de dissonância e (4) os géneros "junkies". Consoante a sua atitude perante os temas audiovisuais, estes consumidores, e potenciais “expedicionários”, são motivados diferentemente por necessidades específicas que variam de acordo com o seu grau de interesse, motivação e da sua atitude mental perante os produtos televisivos.

terça-feira, julho 12, 2011

TELEVISÃO (8): corpo telepresente..

Paul Sermon - "Telematic Vision" (1993- )

A relação, por vezes paupérrima e redutora, que o homem moderno mantém com o médium televisivo, afasta-o do universo interpessoal e interactivo das mostras e festivais. Em reacção a esta tendência, Paul Sermon, praticamente, “instituiu”, desde 1993, uma vídeo-instalação permanente – o Telematic Vision - no Museu de Comunicação de Berna, que perdura até hoje: a televisão e o divã se juntam inseparavelmente num cenário. Nessa exposição o divan é o lugar a partir do qual podemos ver o espectáculo da televisão e, ironicamente, o espectáculo apercebido é precisamente aquele do público sentado num divã. Dois divãs azuis e idênticos (e duas famílias) são instaladas em lugares separados. Cada câmara vídeo transmite uma imagem em directo. Dois monitores transmitem a mesma imagem em lados diferentes, o espectáculo é total. Nesta simultaneidade, os observadores assumem uma função de instalação e se sentam nos seus divãs para olhar a televisão. Trata-se, sobretudo, de uma experiência que propicia a consciência de que pode haver um controlo físico total de um corpo tele-presente, susceptível de interagir com outra pessoa. A experiência do público em relação com as intenções do artista afirma-se, até, no ponto de vista da concepção, da organização e do desenvolvimento da exposição e de preservação da obra.

TELEVISÃO (7): High Definition Television Vídeo - Um novo Sistema de Televisores ou de Televisão?

Um novo sistema de televisão já esta ai! Trata-se de HDTV, que traz uma nova geração de receptores plasma e o Home Cinema. Todas estas mudanças tecnológicas começam a influenciar as atitudes e comportamentos perceptivos. Neste novo cenário as condutas perceptivas começam a disseminar se em implicações de atitude diferenciados frente a cada relato televisivo. Surge o consumo televisivo mais individualizado e com possibilidade de interacção e que fazem um perfil de usuário que e capaz de eleger aquilo que quer. Estamos, pois, perante um fenómeno de mudança de atitudes de consumo. As primeiras consequências são os canais temáticos que fidelizam telespectadores em áreas diversas como cinema, desporto, mundo animal, programas divulgativos sobre a Natureza, entre outros. À atitude de entretenimento ou de diversão do espectador frente ao relato televisivo junta-se, agora, o da vontade formativa. Ao espectador também lhe interessa aprender de maneira permanente. Temos aqui o papel formador e de estimulo cultural da televisão, um serviço que se introduziu, de forma paralela, à democratização das sociedades contemporâneas. Ao mesmo tempo, essa democratização se fez com as possibilidades de interactividade que se abriram na difusão televisiva, como por exemplo a revisão da programação, os serviços de vídeo on demand, e a possível conexão de edição simultânea nos sistemas de edição de notícias na imprensa, rádio e televisão.

segunda-feira, julho 11, 2011

TELEVISÃO (6): SUGESTÕES


Paquete de Oliveira (RTP)


A cultura que se vai edificando sobre o audiovisual tem, portanto, os seus “criadores activos” e “consumidores”. Essa é a conhecida guerra contra o “rio tóxico da violência e do sexo na TV” que se trava nas escolas e ensinos superiores, e através de associação de consumidores, em todos os países desenvolvidos. Pede-se a capacidade de elaborar projectos para televisão que vão de encontro à emergência de novos paradigmas de conhecimentos sociais, científicos e tecnológicos. A propósito, um dos casos mais felizes na elaboração de conteúdos programáticos, nos últimos anos, é, a nosso ver, o programa “Regiões” emitido na TCV (desde 2009), um dos programas de maior alcance social, que investe em profundidade nas complexidades e problemas das regiões e das pessoas. Os relatos e as narrativas sóbrias, aliados à uma boa qualidade das imagens, estilo e sobriedade no design, veiculam informações detalhadas, para além de trazer vozes especializadas nos diferentes assuntos abordados. Apoiando-se em entrevistas, cada jornalista, por cada reportagem apresenta múltiplos pontos de vista retirando daí o essencial do problema.



Sendo, o género televisivo, a reportagem, fácil se torna, entretanto, confundir a panóplia de opiniões recolhidas, em entrevista, com a abordagem de um estado real das coisas, algo que só poderá ser trazido á tona por documentários, narrativas e visões particularizadas de quem vive permanentemente um conjunto de situações para depois os exprimir, com tempo e dinheiro.

Relativamente à questão do «lixo tóxico» da violência e do sexo que flui na programação, há que ponderar a figura de um Provedor que sonda o mercado e a audiência, mantendo-se fiel aos princípios liberalizantes das sociedades democráticas modernas. Algo que poderia ser, também, equacionada no sentido de evitar tendências demasiado corporativas face aos colectivos de civis, cidadãos, telespectadores, adultos e crianças. Fica, igualmente, por reflectir sobre a proposta de Karl Popper, que defende a criação de uma Ordem que forma, prepara, regula e superintende profissionais das emissoras televisivas, ao mesmo tempo que se reforça o carácter educativo e estruturante da TV na vida das crianças e na formação dos adultos.

sexta-feira, julho 08, 2011

TELEVISÃO (5): da degradação das imagens à contemplação original.

"13 Lakes" (2004) - James Benning



Equaciona-se, na actualidade, uma multiplicidade de imagens saídas da técnica e da política gestionária das imagens. A maior parte dessas imagens são geridas pela televisão, de forma sistemática. É reagindo a esta proliferação das imagens televisivas e “tecnopolíticas”, que J. Benning apresentou, ao mundo, o “Thirteen lakes” - uma dessas experiências audiovisuais mais marcantes no cinema contemporâneo que busca simplesmente combater esta tendência para a degradação progressiva da capacidade de ver e de contemplar imagens no seu sentido originário. Os treze maiores lagos do mundo são apresentados em tempos cronometrados de 10 minutos cada, ao longo dos quais nada acontece, senão a própria imagem na sua pureza idílica, um “elixir” para os olhos atravancados pelo “rio tóxico” das imagens televisionadas diariamente. Algo assim, apenas comparável, pela força imaginativa, às exigências presentes em Exercícios Espirituais de Inácio de Loyola, apresentadas por Italo Calvino na sua obra “Seis Propostas para o Novo Milénio” (1990: 104-105) e que passo a citar: “... a composição consistirá em ver com a vista da imaginação o lugar físico onde se encontram a coisa que quero contemplar. Digo o lugar físico, como, por exemplo, um templo ou um monte onde se encontram Jesus Cristo ou Nossa Senhora...”.

quarta-feira, julho 06, 2011

FILMAR O COMEÇO DA INDEPENDÊNCIA

Foto cerimónia/evento: dia da independência de Cabo Verde, 5 Jul 1975, Praia, Santiago, Cabo Verde. militar ao centro, a segurar a nossa primeira bandeira para ser içada em seguida. Cerimónia no campo de futebol da Várzea.


Nos anos 70 em Cabo Verde, o facto mais marcante no cenário da “contracultura” e da emancipação de uma cultura popular e autóctone face ao poder simbólico do império colonial português, pode ter sido a criação do Cine Clube da Praia, ao qual se outorgava a 7 de Maio de 1975 o respectivo Estatuto. Anastácio Filinto Correia e Silva, [cinéfilo, homem da cultura cabo-verdiana (60-70), e um dos organizadores] enquanto cidadão, ia falando com as pessoas e “arranjando coisas sem atrevimento de querer mandar mensagens”. Isso, nas palavras do referido activista que fora, provavelmente, um dos poucos com pretensões claras relativamente à uma contracultura e emancipação de novos valores, mais radicados no indivíduo. Antes do cair da independência, conheceu o operador de câmara – o Betinho Melo - e convidou-o a fazer uma “coisa” histórica: filmar o começo da independência. “Para que Portugal pudesse assinar a declaração, Cabo Verde teria de fazer uma manifestação de força” “Fizemos, então, um pacto: se a população fosse votar (mesmo que seja um partido único, um voto dava para a vitória) filmava-se o acto. Mais ainda, trabalhou-se no duro para que houvesse uma votação que se visse. Toda a gente que tinha uma câmara de filmar se predispunha a ajudar. A Casa Comercial Serbam ofereceu as películas” confessou-nos o ex-radialista.

Num acto sem precedentes ocorria, pela primeira vez, a primeira manifestação de uma contracultura radicada no vídeo e na liberdade de expressão, sob um acontecimento único na história de Cabo Verde. Segundo afirmações do ex-activista, teve que se explicar o processo aos que entravam pela primeira vez nesse jogo de representações, de como se devia filmar, os movimentos que a pessoa devia fazer, e, fundamentalmente, a ideia de que se devia emprestar o próprio corpo para um filme. Toda essa história da emancipação caboverdeana, pelo cinema e depois, pelo vídeo, foi-nos confiada, entrecortada nas palavras deste homem da cultura (a).


Para a história documentalizada ficava, todavia, o registo de 32 minutos sobre a Independência Nacional editado em DVD, realizado por Lennart Malmer e Ingela Romare em 1975, e posta em circulação juntamente com uma emissão radiofónica de 45 minutos do programa nocturno de 04 de Julho de 1995, conduzido por Carlos Gonçalves, intitu¬lado Retrospectivas das Festas de 5 de Julho de 1975.


(a) O vídeo em causa ainda esteve em circulação nas maõs dos dirigentes políticos de então, mas depois desapareceu sem deixar rastos. (Uma história que já conhecemos do caso «O Segredo de Um Coração Culpado»).

terça-feira, julho 05, 2011

TELEVISÃO (4): Da crise da verdade televisiva ao cinema de ficção.

A crise da realidade provocada pela Guerra do Golfo, em Janeiro de 1999, e posteriormente pela guerra do Afeganistão, em 2001, na ressaca dos atentados de 11 de Setembro, levantou o problema da utopia da objectividade televisiva: a imposição de uma hipotética história objectiva da guerra não teve sentido. O poder omnisciente da CNN encontrou, desde logo, na altura, um contraponto na contra-informação da cadeia televisiva do mundo islâmico AL-Jazeera. O jogo sujo da guerra das imagens - que se impôs e se impõe durante esses acontecimentos - não cessou, e numerosas imagens e informações se colocaram sob suspeita. A crise da verdade televisiva, e, com ele, o modelo de utopia da informação, pôs em crise um modelo de realismo entendido como afirmação da objectividade e trouxe ao primeiro plano os limites da ficção.


Atentemo-nos, por exemplo, no caso do casal McCann que ganhou contornos grotescos e assombrosos prefigurando-se, cada vez mais, como o maior embuste televisivo infligido ao espectador. O problema de fundo é que se começa a estabelecer uma fronteira difusa entre o real e a ficção. À determinada altura do espectáculo televisivo não temos a garantia de que a reacção do casal é genuína. As luzes da ribalta os transformaram em melhores actores? Até que ponto a questão deixou de ser o desaparecimento da menina para se tornar numa especulação desenfreada à volta da mentira e da verdade dos nossos afectos? Estabeleceu-se, já, ao nível do conhecimento humano, uma reformulação do conceito clássico de ficção que voltou a centrar o debate na necessidade ficcional como instrumento para o conhecimento e questiona-se, cada vez mais, no mundo académico, a importância que a ficção pode exercer dentro de uma cultura contemporânea na qual se impôs, para já, uma crise de objectividade informativa.


Para chegar ao conhecimento das causas reais a história teria que deixar de ser explicação para transformar-se em interpretação das intenções, sentimentos e razões das pessoas envolvidas, defendia Georg Simmel, ainda, no inicio do séc. XIX. Deste modo, somos cúmplices de toda a realidade e estaremos, então, a buscar a nossa verdade ao elevar o nosso nível de interpretação, daquilo que levamos em nós, para ultrapassar essa contínua suspeita em relação á informação televisiva.

A tendência actual é que o cinema de ficção, como documento histórico (*), pode estar a responder facilmente a algumas das questões que se encontram em contínuo movimento no presente, mediante a sua fabulação. As imagens já não são o reflexo da realidade mas sim a sua construção. Os procedimentos de carácter estrutural, formal ou técnico dos cineastas devem, em princípio, desvelar o pensamento de uma época. Na qualidade de construtor das realidades estão casos paradigmáticos como a América "paranóica" de Oliver Stone ou o activismo político de Michael Moore.


(*) Não confundir com cinema documental.

sábado, julho 02, 2011

"EDEN": REQUIEM PARA UM SONHO ESQUECIDO

Fotografía de Daniel Blaufuks





«Eden», de Daniel Blaufuks, explora a perda original. Visualmente forte, é um filme sobre a memória da memória. Na verdade há duas memórias neste singelo documentário: a dos intervenientes que estão nele (Daniel Mascarenhas, Manuel Figueira, Spencer,...) e a da própria matéria do filme. É, também, um longo requiem, para os sonhos do cinema vividos no Cinema Eden Park, soberbamente filmada, com um climax «ficcional», na penúltima cena, interpretada por Malaquias*, com o seu violino solitário e translúcido, a preencher o espaço arruinado e vazio em que se transformou o local. Resta a música para resgatar a memória do cinema caboverdeano e isso nota-se nas cenas em que alguns intervenientes, tendo já esquecido algumas cenas de um filme, cantarolam uma canção que o representou.


O realizador erigiu, de forma esclarecida e tranquila, um monumento ao cinema e encerrou um capítulo na história do "cinema caboverdeano". Mais do que as peripécias de um filme («O Segredo de um Coração Culpado») que, talvez, tenha ficado retido nas alfandegas de Dakar e, posteriormente, destruído, quis o realizador focar-se nas possibilidades de concluir esse esforço do "cinema", que outrora se queria fazer em Mindelo ou, provavelmente, recriá-lo nas suas parcelas. Um processo equivalente à da mumificação de um «corpo» de memórias, demasiado valioso, num ritual envolvendo a plateia e o filme.

sexta-feira, julho 01, 2011

TELEVISÃO (3): A crise da “verdade televisiva”

Estávamos a 22 de Janeiro de 2010 e o país chegava a uma tal apoteose que a TCV nem sequer “se explicou” quando o partido no governo PAICV fez emitir em directo o seu XII Congresso fazendo-o parecer um mero acontecimento, à semelhança dos jogos ou cerimónias de empossamento. Teríamos que ser ingénuos para não exigir da TCV, pelo menos, um selo identificativo do quê se tratou ali. E não é por se tratar especificamente do PAICV, mas por se tratar de um partido como qualquer outro. Mais do que isso, é pactuar com uma ideologia, o que não é prática jornalística. Isso ficou espelhado no tratamento jornalístico que se deu ao acontecimento. A narração (um "vivo" feito por uma jornalista da referida estação) conta toda a história do Partido, tendo como pano de fundo as imagens do referido Congresso onde se viam figuras importantes e destacadas da história do partido e do país. A expressividade na voz da jornalista carregava eloquência, magnanimidade com um inelutável sentido ideológico e de espectáculo. Viu-se uma estação, no mínimo, tribal com os seus líderes, que chegam sem primeiro bater, mas, logo, recebidos com pompa e circunstância. Esta é a crise da nossa televisão, a crise da sua verdade televisiva que também toca outros canais espalhados pelo mundo, sempre que um poder mais forte e obsidiante se apodera dos órgãos de comunicação social para erigir um “monumento” à guerra ou á vaidade.