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terça-feira, maio 29, 2012

PRELÚDIOS SOBRE O ESTATUTO DO ARTISTA (6)


A 7.ª Arte e o Artista


Pressupor o que, no cinema, se deve considerar Arte coloca em jogo muita coisa. Numa das obras literárias mais singelas sobre o cinema Martin (2005) afirma que, em relação a linguagem cinematográfica, duas tendências se afirmaram desde sempre: primeiro, o uso de meios “cinematográficos” de expressão (cortes de planos, efeitos especiais, etc) e, segundo, uma narrativa clara sem cortes, o que se convenciona chamar de «une piéce bien faite». Nesta distinção não está, porém, definida a fórmula para aquilo que se considera Arte. Normalmente, o público que se formou na primeira tendência tem problemas em encarar a segunda e vice-versa. São, de facto, dois «grupos de apresentação» diferentes.


Em termos estéticos a questão do que é Arte, e do que não é, se agrava quando se trata, por exemplo, do género documentário. Segundo Hauser (2000), com o filme documentário surge a necessidade de mostrar a realidade «como realmente ela é» ou, com certa frequência, mesmo, mediante a «completa renúncia da arte». O autor vai mais longe e atesta: 


“Em nossos dias o prestigio da estética está sendo corroído de muitas maneiras. O documentário, a fotografia, as reportagens jornalísticas, o romance-reportagem já não são arte na antiga acepção da palavra. Além disso, os mais inteligentes e mais talentosos representantes desses géneros não fazem nenhuma questão que seus produtos sejam descritos como «obras de arte»” (pp.990)

Muitos destes novos realizadores de documentário admitem, segundo Hauser, que os seus trabalhos são «sub-produtos» que surgem «ao serviço de um propósito ideologicamente condicionado» e quando o seu trabalho é considerado Arte deve-se ao reconhecimento de uma comunidade de artistas, que acaba por funcionar como «grupo de apresentação», na linha conceptual de Dickie. É o caso de Michael Moore que, ironicamente, é agraciado pela comunidade artística de Hollywood ao receber a Palma de Ouro no Festival de Cannes 2004, não pelo tema documental explorado, mas, sim, pelo uso inteligente das técnicas da linguagem cinematográfica e pela arte do cinema. Foi isso o que Quentin Tarantino sussurou, nessa altura, no ouvido deste realizador estado-unidense,: “we want you to know that it was not the politics of your film that won you this award. We are not here to give a political award. Some of us have no politics. We awarded the art of cinema, that is what won you this award and we wanted you to know that as a fellow filmmaker”.

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